Marcus Vinícius Beck

O presidente Jair Bolsonaro anunciou na última semana que o teto da Lei Rouanet vai despencar para R$ 1 milhão com o objetivo de “frear a mamata” aos artistas renomados. Em entrevista concedida na última terça-feira (9) no Palácio do Planalto ao programa “Os Pingos nos Is”, da rádio paulista Jovem Pan, ele afirmou que está colocando “uma trava” por meio de renúncia fiscal ao principal mecanismo de fomento à cultura.

“O teto hoje em dia, acredite, é R$ 60 milhões, R$ 60 milhões. De acordo com o teu tráfico de influência no passado, você conseguiria R$ 10 milhões, R$ 15 milhões, R$ 20 milhões, até mais. Nós estamos processando para R$ 1 milhão, então tem gente do setor artístico que está revoltada e quer algumas exceções”, explicou o chefe de Estado, num dos principais programas da emissora porta-voz da chamada ‘nova direita’.

Bolsonaro frisou que o valor estipulado como teto é suficiente para o artista “divulgar e ter um espaço junto ao povo brasileiro para sua obra”. Na conversa, o direitista garantiu que, se o teto de R$ 1 milhão era por projeto ou por proponente, conforme especulou o mercado cultural na última segunda-feira (8), programas anuais de museus, orquestras, festivais e bienais devem ser a exceção e vão poder exceder o montante.

Ancorado na concessão de benefícios fiscais a empresas que tenham como objetivo bancar projetos artísticos, a Lei Rouanet chegou a ser alvo de críticas de Bolsonaro e seus simpatizantes na última eleição. No momento, o incentivo prevê captação de R$ 60 milhões por ano para até 16 projetos por proponente, gerando emprego, renda e inclusão, segundo disse em julho de 2018 o ex-ministro da cultura, Sérgio Sá Leitão.

Exposição é uma das categorias financiadas via Lei Rouanet (Foto: Reprodução)

Em Goiás, no ano de 2016, havia 15 projetos culturais contemplados pela lei, mas a reportagem não conseguiu checar no site do Ministério da Cidadania – pasta foi rebaixada ao status de Secretaria Especial de Cultura em janeiro – qual era o valor captado para iniciativas como o Museu Casa de Cora Coralina, localizado na Cidade de Goiás. A Casa Velha da Ponte preserva a obra e objetos da poeta Cora Coralina.

Em tuíte do ano passado que a reportagem resgatou, ainda antes de sair o resultado das urnas, Bolsonaro dissera que “incentivos à cultura permanecerão”, porém ele destacou na ocasião que seria destinado a “artistas talentosos que estão iniciando suas carreiras e não possuem estrutura”. “O que acabará são os milhões de dinheiro público financiando ‘famosos’ sob falso argumento de incentivo cultural”, escrevera então candidato.

Exceções

Apesar de ter anunciado redução no teto da Lei Rouanet, o governo de Jair Bolsonaro pode abrir exceções. Conforme reportagem publicada no jornal “Folha de São Paulo” na edição de ontem, o limite estipulado pelo presidente não vai servir para todos os casos. A nova instrução de como será a normativa daqui para frente deve ser anunciada na próxima semana.

Na última terça-feira (9), durante encontro com prefeitos em Brasília, o ministro da cidadania, Osmar Terra, chegou a contradizer a fala de Bolsonaro à Jovem Pan. Segundo Terra, a intenção do Governo Federal é restringir o montante que era destinado a espetáculos musicais e, com isso, manteria os mesmos recursos que eram aplicados nos últimos anos ao cinema, à música, à literatura, ao teatro e à dança.

Produtores que conversaram com o Metamorfose disseram que é necessário lutar para manter viva a Lei Rouanet, mas levaram em consideração os diversos casos em que grandes empresas conseguiram captar recursos e prejudicaram artistas pouco conhecidos. A classe lembrou que o fomento foi durante anos responsável por manter projetos de alto custo no País, especialmente a produção audiovisual.

“Museus, centros culturais e algumas orquestras, que dependem da Rouanet para bancar suas operações anuais, também entrariam na mira, embora esboços do projeto do governo de restrição da lei antes previssem uma exceção para esses casos”, afirma o produtor cultural, diretor artístico e professor do curso de produção cênica, Rafael Blat.

Em entrevista concedida ao JM na Mostra de Cinema de Tiradentes, que conta com recursos oriundo da Lei Rouanet, a documentarista Fabiana Assis afirmou que a classe artística vem sentindo os efeitos das críticas feitas ao incentivo por apoiadores do capitão da reserva do Exército. Ela realizou o longa-metragem “Parque Oeste”, premiado na Mostra Olhos Livres do festival mineiro, com verba federal e teme pelo futuro.

“Ficar recebendo essas críticas de gente que são sabe o que está falando é muito duro. E em todas as artes tem esses ataques. Nós não sabemos de fato o que vai acontecer”, comentou a cineasta, na ocasião, acrescentando que o atual momento é de incerteza. “A gente não sabe o que vai acontecer. Mudou o governo e nós temos bastante dúvidas. O Estado tá falindo”, concluiu.

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